segunda-feira, outubro 26, 2009

Sinergia

O mundo pára em momento único
Parace sonho. Não quero acordar.
Mesmo sendo 1 + 1 > 2 , era real.

Débora L. Hübner

quarta-feira, outubro 21, 2009

O Velho e a Flor

Por céus e mares eu andei,
Vi um poeta e vi um rei
Na esperança de saber
O que é o amor.

Ninguém sabia me dizer,
Eu já queria até morrer
Quando um velhinho
Com uma flor assim falou:

O amor é o carinho,
É o espinho que não se vê em cada flor.
É a vida quando
Chega sangrando aberta
em pétalas de amor.

Vinícius de Moraes


Poética

De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.

A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O este é meu norte.

Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontem

Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
– Meu tempo é quando.

Vinícius de Moraes

quarta-feira, setembro 23, 2009

Drummond mais uma vez...

Eterno é tudo aquilo que dura uma fração de segundos, mas com tamanha intensidade que se petrifica e nenhuma força consegue destruir.

Carlos Drummond de Andrade

sábado, setembro 05, 2009

Drummond

“Se procurar bem você acaba encontrando.
Não a explicação (duvidosa) da vida,
Mas a poesia (inexplicável) da vida.”

Carlos Drummond de Andrade

terça-feira, agosto 04, 2009

Pequena casa na grande fronteira

(Onde e como encontrar segurança hoje em dia. Ano Novo, 1965.)

     Estamos na época de aumento de consumo de bebida alcoólica e de estômagos doentes, de pequenas anedotas e historinhas edificantes. Quem se leva um pouco a sério decide tornar-se um sujeito decente no ano que vem, Assim como faz todos os anos nesta época. Quem tem caráter começa a meditar. Quem não tem sente desejo de tê-lo. Todos temos muito trabalho neste período com belas almas.
     Até recentemente, também meu amigo Günter era desses que todos os anos sentem esse tipo de nostalgia, em especial a cada fim de ano. Meu amigo Günter tinha saudade da segurança. É compreensível que a cada fim de ano essa saudade crescesse, neste nosso tempo tão feliz... Mas de repente a nostalgia sumiu. Ele não a sente mais, não porque ele tenha morrido. Não, meu amigo ainda vive, e é um homem feliz. Penso apenas que é meu dever de cristão contar sua história, para que outros possam se divertir e se estimular com ela.
     Meu amigo Günter era um pequeno empregado numa pequena cidade. Não morava na cidade, mas perto dela. Numa pequena casa com três criancinhas e uma mulherzinha. Eram a sua família. A pequena cidade na qual ele trabalhava ficava junto de uma grande fronteira. E a pequena casa onde ele morava ficava mais perto dela ainda. Todas as manhãs quando meu amigo Günter se dirigia à pequena estação ferroviária para ir até a pequena cidade, andava um pedaço ao longo da grande fronteira. Então, manhã pós manhã, mês a mês, meu amigo Günter viu no nevoeiro matinal, silhuetas gigantescas e ameaçadoras: as escuras sombras dos tanques e canhões, postados em grande quantidade dos dois lados da grande fronteira.
     Depois de contemplas essas silhuetas durante alguns meses, todas as manhãs, ele não conseguiu mais dormir. Ficava acordado na cama à noite, refletindo. De todas as regiões inseguras que há no mundo de hoje, refletia ele, esta é a mais insegura. Não se pode nem descrever como é insegura esta região. Se alguma coisa acontecer um dia, todos estaremos mortos tão depressa que antes nem teremos tempo de gritar “Viva!”. Ou “Abaixo tudo isso!”. Mas eu não quero morrer. Nem quero que minha mulherzinha e meus filhinhos morram. Quero segurança. Para minha mulherzinha e meus filhinhos. E para mim mesmo também. Preciso ir embora daqui, refletia meu amigo Günter, preciso sair desse lugar, o mais inseguro da Europa! Mas como?
     Ele não tinha dinheiro, e sem dinheiro não há segurança. Então, o pobre-diabo continuou correndo dia após dia para a estação ferroviária, e vendo as silhuetas dos tanques e dos canhões que ameaçava no nevoeiro matinal...
     Foi quando (essas coisas ainda acontecem) morreu uma tia rica nos Estados Unidos. Deixara meio milhão de dólares ao seu sobrinho Günter, e meu amigo decidiu emigrar. Com a mulherzinha e os três filhinhos. Agora, pensou, tenho dinheiro bastante para me permitir a busca da segurança. Ainda não sabia ao certo para onde queria emigrar. Desejava ir para onde lhe permitissem a maior segurança. Primeiro, a família foi para os Estados Unidos. Para apanhar todo aquele dinheiro.
     O que aconteceu ao meu amigo Günter e sua família nos dois anos seguintes, na procura de segurança, é quase inconcebível. Nos Estados Unidos quase morreram num tufa. Transferiram-se par ao Oeste. No Oeste quase foram escalpelados por índios. Então, foram para o Sul. No Sul quase foram executados como espiões numa dessas muitas pequenas revoluções. Mudaram-se para a Austrália. Lá as crianças caíram numa toca de lebres e quase morreram sufocadas. Tentaram a África, onde, porém havia cobras venenosas que quase levaram a mulherzinha de Günter para a eternidade. Não falemos na Ásia. Lá lhes roubaram a metade de seu meio milhão de dólares, pois chegaram a uma região de catástrofes e não conseguiram (nem com todo o seu dinheiro) comer nada senão arroz durante um bom tempo. E mesmo assim em porções muito pequenas.
     Desse modo, meu amigo Günter andou pelo mundo todo em busca da segurança, e ficou doente dos nervos, tinha cicatrizes por todo o corpo e cabelos brancos. Sua mulher e filhos sofriam coisa semelhante. Por fim, não agüentaram mais e decidiram voltar para a pequena casa na fronteira. Por pouco tempo. Para dormirem direito – pois há muito tempo não conseguiam fazer isso.
     Voltaram para a pequena casa e ainda hoje estão lá. Não apenas dormem bem. Não – voltaram a morar lá, como antigamente. Todas a manhãs meu amigo Günter vai à estação para ir até a cidade e, como antigamente, vê as silhuetas dos tanques e canhões no nevoeiro matinal. Agora são mais silhuetas ainda. Meu amigo Günter sorri quando as avista. Está dominado por uma calma infinita. Se existe segurança em algum lugar, escreveu-me, é aqui, nesta pequena casa junto da grande fronteira. E acrescenta que nunca foi tão feliz. Pois agora, diz, encontrou sua segurança.
     Não a encontrou na Europa, nem na Ásia, nem na África, Austrália ou Estados unidos.
     Encontrou-a no único lugar onde a gente pode encontrá-la hoje em dia, quando se tem sorte: dentro de si mesmo.
     Bom Deus, permiti que também encontremos segurança neste novo ano, todos nós, os incontáveis milhões de seres humanos que hoje vivemos em pequenas casas na grande fronteira entre a morte e a vida.


Johannes Mario Simmel – Retirado do livro “A Terra ainda é jovem”

segunda-feira, julho 20, 2009

Os ombros suportam o mundo

Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.

Carlos Drummond

quinta-feira, julho 09, 2009

O Quadro

Não tinha pretensão de ser artista, mas naquela manhã foi cúmplice de uma grande arte. Feito criança, pintou, bordou, posou. E como todo artista, se deixou levar pela loucura... Loucos, inconseqüentes, indignos? Naquela manhã o certo e o errado duelaram em seus inconscientes. Não se sabe se foram os olhares, o cheiro, o sorriso ou as palavras sinceras... Entre a razão e a loucura e o desejo de eternizar as horas, lhe restou pintar o quadro proibido em sua memória. De moldura da cor dos sonhos, jamais vira um quadro que espelhasse tamanha realidade.

Débora L. H./Julho de 2009.

terça-feira, junho 09, 2009

Levo Comigo

Recolho memórias e fatos
histórias, slides.
Gestos e lugares e canções.
Guardo em baú de lembranças
que assisto do balcão do castelo encantado.
Um fato, mil instantes levo comigo.

Débora Linden Hübner
Junho de 2009


segunda-feira, junho 08, 2009

Eu amo o mundo!
Eu detesto o mundo!
Eu creio em Deus!
Deus é um absurdo!
Eu vou me matar!
Eu quero viver!
- Você é louco?
- Não, sou poeta.

Mario Quintana

domingo, maio 24, 2009

Passos de Nuvem

Leves como se andassem em nuvens
e lentos pelo caminho incerto

Não sei onde os passos me levam
não sei se quero ir, também não quero ficar

Em sonho vôo onde os passos não chegam
lembranças não alcançam

O mundo me esquece
me ensina a esquecer o mundo?

Débora Linden Hübner


domingo, maio 10, 2009

Fere de leve a frase... E esquece... Nada
Convém que se repita...

Só em linguagem amorosa agrada
A mesma coisa cem mil vezes dita.

Mario Quintana

Como quisesse livre ser

Como quisesse livre ser, deixando
As paragens natais, espaço em fora,
A ave, ao bafejo tépido da aurora,
Abriu as asas e partiu cantando.

Estranhos climas, longes céus, cortando
Nuvens e nuvens, percorreu: e, agora
Que morre o sol, suspende o vôo, e chora,
E chora, a vida antiga recordando ...

E logo, o olhar volvendo compungido
Atrás, volta saudosa do carinho,
Do calor da primeira habitação...

Assim por largo tempo andei perdido:
— Ali! que alegria ver de novo o ninho,
Ver-te, e beijar-te a pequenina mão!

Olavo Bilac

sábado, abril 18, 2009

Amor e seu tempo

Amor é privilégio de maduros
estendidos na mais estreita cama,
que se torna a mais larga e mais relvosa,
roçando, em cada poro, o céu do corpo.

É isto, amor: o ganho não previsto,
o prêmio subterrâneo e coruscante,
leitura de relâmpago cifrado,
que, decifrado, nada mais existe

valendo a pena e o preço do terrestre,
salvo o minuto de ouro no relógio
minúsculo, vibrando no crepúsculo.

Amor é o que se aprende no limite,
depois de se arquivar toda a ciência
herdada, ouvida. Amor começa tarde.


Carlos Drummond de Andrade

quarta-feira, março 25, 2009

Em Transe

      Foi como ligar o piloto automático. Mas não houve problema. Os sinais estavam abertos e cobertos de verde. No ar o perfume que a mantinha em transe. Indecifrável. Podia ser da noite, do sereno, da chuva da madrugada ou não. Sentia o aroma da sinceridade e o peso na consciência que ela havia causado.
      Desejou que a noite não terminasse. A conversa fluia como boa música aos ouvidos. Afinal, num contexto de funk era raro que os clássicos do rock se encontrassem. Pareceu mágico.
      E a magia fez com que depois de muito tempo, em cada gesto e cada palavra fosse sincera e não tivesse receios com quem pouco conhecia. Talvez por isso sentia-se frágil e quase deixou escapar uma lágrima.
      Tentou não pensar, não se importar, mas a realidade não se esconde por traz das luzes da pista de dança ou da luz das estrelas daquela noite. Decidiu... "nothing else mathers". Ao menos por aqueles momentos. A realidade ficava para o dia seguinte, quando o perfume a deixasse e acordasse do transe.

Débora Linden Hübner / Março de 2009.